O português falado pelos deputados

[Escrito por Gustavo Eiji Kaneto]
 
A câmara dos deputados pode não ser diversa nos quesitos gênero, idade, cor da pele… mas tem gente lá de todos os estados, de muitos sotaques. Uma amostra bem diversa da língua portuguesa que se pode encontrar no Brasil.
Não vamos usar “não sabe falar português” como crítica, portanto. Nenhuma fala de brasileiro faz uso corretíssimo e completo (ainda bem) de plural, concordância, regência… sotaques diferentes usam (e desusam) essas regras de maneiras diversas. E isso não faz da pessoa menos inteligente.
Conseguir seguir a norma culta da gramática – um monte de regras, algumas mais “naturais”, outras simplesmente cagadas – é bem diferente de conseguir articular ideias, se comunicar bem e fazer política (no bom sentido; não “ser politiqueiro”).
Tem um monte de coisa pra ser dita sobre esse assunto, mas vou destacar uma: o português culto hoje está construído em cima de muitos “erros” – variações, na verdade – de fala.
Se você acha engraçado alguém que fala “otcho”, em vez de “oiTo”, lembre-se que talvez você fale “tchitchia”, em vez de “TiTia”. E, além, é mais provável que você fale “oitU” e não “oitO”.
Se você acha ignorância, talvez até sinal de atraso cognitivo, alguém falar “pranta” e “cráudia”, aham, senta lá. “Escravo” é sclavus em latim, esclave em francês e esclavo em espanhol.
A língua, suas normas e variações têm sido bastante usadas para dominação sociocultural (Por que falamos português no Brasil, mesmo? Por que só se fala português na Câmara?), mas podemos evitar entrar nesse jogo. Podemos até tentar virá-lo.
(Se você visse como a Acadamia Brasileira de Letras decidiu certas coisas sobre a aplicação do novo Acordo Ortográfico cá em textos brasileiros, você ia se sentir bem mais livre pra escrever do jeito que você quiser.)
E se você quiser ler mais sobre o assunto, vê esse livrinho aqui: Preconceito Linguístico, do Marcos Bagno.

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