15 Maio 2021
Quando alguém diz que a educação brasileira é ruim, do que está falando? Porque o papel da escola é amplo e vai além de desenvolver a dimensão intelectual do aluno. Será que a pessoa se refere ao que os professores sabem? À forma como ensinam? A quanto os alunos aprendem? Ao quanto a escola identifica, acolhe e resolve as necessidades de seres humanos em fase de formação? Aos resultados dos alunos nas provas de português e matemática? Será que imagina que transferir os alunos para as escolas particulares resolveria o problema? Sem dar a eles a refeição que muitas vezes falta em casa? Sem levar em conta qual e como é o trajeto até a escola? Será que a pessoa compreende que parte do desenvolvimento cognitivo e intelectual ocorre fora da escola, com os livros que a criança lê em casa, com as conversas de que participa com a família, com as viagens, os filmes, os passeios, as perguntas, com seu entorno de modo geral? Com o estímulo que recebe ou a falta dele? Com as obrigações que tem fora da escola, que para muitas inclui trabalhar? E, do outro lado dessa conversa colada em extremos, o que significa a dita educação de qualidade? Uma educação adaptada para resultar em boas notas nos testes internacionais, ainda que outros valores e competências fiquem de fora? Uma educação baseada na memorização de informações, ainda que alunos muito jovens desenvolvam ansiedade em função da pressão por bons resultados? O que pode ser colocado em jogo em nome do que vai ser considerado uma boa educação? O que ou quem se culpa pelo que é considerado educação ruim? O que se espera dos professores?
Não são só os números que faltam na discussão, mas a própria concepção de educação. Os leitores de manchete sabem que o Brasil ocupa as últimas posições do PISA, mas o que isso significa para além do ranking? O que espera como mudança quem descobriu essa informação só com a superficialidade de uma manchete? De uma discussão sobre educação, mais que ouvir da outra pessoa os números que ela decorou, eu esperaria ouvir o que ela entende do que está dizendo, porque talvez seja nesse aprofundamento que se evidencie ainda mais o que o outro nem imaginava não saber.
Quanto ao argumento sobre a educação da Finlândia, que tal olharmos para o que realmente foi feito lá? Um documento da OCDE chamado “Finland: Slow and Steady Reform for Consistently High Results” pode nos ajudar a entender melhor o cenário. Algumas das mudanças que a Finlândia realmente fez foram: garantir uma refeição quente diária por aluno; oferecer tratamento médico e dentário para alunos e famílias; disponibilizar aconselhamento psicológico para alunos e famílias; tornar o mestrado obrigatório e oferecer mais treinamento e acompanhamento para os professores; reduzir o currículo nacional; dar mais autonomia para os professores; reduzir o número de horas de ensino, de modo que os professores também tivessem tempo para definir o próprio currículo. Em 1993, a Finlândia estava perto de um colapso econômico. Ela está longe de ser um dos países com maior gasto por aluno no mundo, mas conseguiu melhorar o desempenho educacional com um conjunto de decisões políticas implementadas e sustentadas por um longo período. Dá pra perceber que não se trata apenas do currículo ensinado em sala de aula?
@carolinajesper
Mestra em educação. Autora de livros didáticos.
Quando alguém diz que a educação brasileira é ruim, do que está falando? Porque o papel da escola é amplo e vai além de desenvolver a dimensão intelectual do aluno. Será que a pessoa se refere ao que os professores sabem? À forma como ensinam? A quanto os alunos aprendem? Ao quanto a escola identifica, acolhe e resolve as necessidades de seres humanos em fase de formação? Aos resultados dos alunos nas provas de português e matemática? Será que imagina que transferir os alunos para as escolas particulares resolveria o problema? Sem dar a eles a refeição que muitas vezes falta em casa? Sem levar em conta qual e como é o trajeto até a escola? Será que a pessoa compreende que parte do desenvolvimento cognitivo e intelectual ocorre fora da escola, com os livros que a criança lê em casa, com as conversas de que participa com a família, com as viagens, os filmes, os passeios, as perguntas, com seu entorno de modo geral? Com o estímulo que recebe ou a falta dele? Com as obrigações que tem fora da escola, que para muitas inclui trabalhar? E, do outro lado dessa conversa colada em extremos, o que significa a dita educação de qualidade? Uma educação adaptada para resultar em boas notas nos testes internacionais, ainda que outros valores e competências fiquem de fora? Uma educação baseada na memorização de informações, ainda que alunos muito jovens desenvolvam ansiedade em função da pressão por bons resultados? O que pode ser colocado em jogo em nome do que vai ser considerado uma boa educação? O que ou quem se culpa pelo que é considerado educação ruim? O que se espera dos professores?
Não são só os números que faltam na discussão, mas a própria concepção de educação. Os leitores de manchete sabem que o Brasil ocupa as últimas posições do PISA, mas o que isso significa para além do ranking? O que espera como mudança quem descobriu essa informação só com a superficialidade de uma manchete? De uma discussão sobre educação, mais que ouvir da outra pessoa os números que ela decorou, eu esperaria ouvir o que ela entende do que está dizendo, porque talvez seja nesse aprofundamento que se evidencie ainda mais o que o outro nem imaginava não saber.
Quanto ao argumento sobre a educação da Finlândia, que tal olharmos para o que realmente foi feito lá? Um documento da OCDE chamado “Finland: Slow and Steady Reform for Consistently High Results” pode nos ajudar a entender melhor o cenário. Algumas das mudanças que a Finlândia realmente fez foram: garantir uma refeição quente diária por aluno; oferecer tratamento médico e dentário para alunos e famílias; disponibilizar aconselhamento psicológico para alunos e famílias; tornar o mestrado obrigatório e oferecer mais treinamento e acompanhamento para os professores; reduzir o currículo nacional; dar mais autonomia para os professores; reduzir o número de horas de ensino, de modo que os professores também tivessem tempo para definir o próprio currículo. Em 1993, a Finlândia estava perto de um colapso econômico. Ela está longe de ser um dos países com maior gasto por aluno no mundo, mas conseguiu melhorar o desempenho educacional com um conjunto de decisões políticas implementadas e sustentadas por um longo período. Dá pra perceber que não se trata apenas do currículo ensinado em sala de aula?
@carolinajesper
Mestra em educação. Autora de livros didáticos.

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